Doses maiores

8 de abril de 2017

Uma espécie de morte a ser superada

Publicado em 1981, o livro “Não Verás País Nenhum”, de Ignácio de Loyola Brandão, antecipa fenômenos com os quais só convivemos mais recentemente. Por exemplo:

Como poderíamos chamar a essa nova fórmula? Sistemas dissimuladores? Assemelham-se, porém não são. São, mas não se assemelham. Um jogo de esconde. Como se entrássemos num labirinto de espelhos e perdêssemos a imagem verdadeira. Ou todas as imagens à nossa volta dadas como verdadeiras.

Como chamar? Que tal “redes sociais”?

Na passagem abaixo, difícil não lembrar dos neoliberais instalados nos governos:

...os tecnocratas adquiriram a supremacia. Suas falanges ocuparam os postos sem dar tempo a ninguém de adaptação. Romperam violentamente com os esquemas, se instalaram. Certos de que o futuro era deles.

O cenário do começo do século 21 descrito pela obra é desolador: “Acredita, nunca vi uma árvore de verdade na minha vida? Sempre morei em São Paulo, nunca deu para viajar”.

Mas o livro também tem alguns momentos de esperança. Como na passagem em que o personagem principal vê surgindo do solo ressecado pelo aquecimento global uma “pequena e alegre planta”. Poderia ser “uma nova espécie vegetal”, imagina ele. “A natureza alarmada desenvolvendo dentro dela um processo de reconstituição. O poder de se recriar. Por que não?”

E conclui:

Me ocorreu que isso é a liberdade. A capacidade de ressurgir continuamente, sob novas formas, revigorado. O processo de se recompor, tombar e erguer nada mais é que tática, dissimulação. Um jeito de enganar a morte, derrotá-la. Que a morte é simples estágio superável.

Realmente, vida sem liberdade é uma espécie de morte. Mas é morte que pode ser revertida.

2 comentários:

  1. Lembro do grande impacto desse livro já no lançamento para a minha juventude. Vivendo tempos finais de ditadura militar, greves operárias, surgimento do PT, exilados voltando. Eram tempos sombrios, mas de grandes esperanças. Hoje está mais para o sombrio. É, como dizem, tem obras que serão eternas.

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    1. Também li nessa época, Marião. Concordo. Parecia muito pessimista para a época. Hoje tá mais pra realista.
      Valeu!

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