Doses maiores

1 de agosto de 2016

O Museu do Amanhã encalhado em sangue preto

O Museu do Amanhã pretende ser uma nave espacial vinda do futuro para se ancorar nas águas sujas da região portuária da capital carioca.

Administrado pela Fundação Roberto Marinho, o museu afirma oferecer:

...uma jornada rumo a futuros possíveis, a partir de grandes perguntas que a Humanidade sempre se fez. De onde viemos? Quem somos? Onde estamos? Para onde vamos? Como queremos ir?

Mas à questão sobre o passado de que viemos a instituição responde de maneira bastante insuficiente. A construção fica na região em que chegaram quase um milhão de pessoas escravizadas vindas da África.

Foi próximo dali, no cais do Valongo, que por três séculos  aportaram os navios negreiros. Muitos dos que sobreviviam à viagem nestes matadouros flutuantes morriam logo ao desembarcar. Eram enterrados no chamado Cemitério dos Pretos Novos.

Tanto o Valongo como o Cemitério ganharam memoriais. Mas o investimento em sua construção não chega aos pés do que recebe o museu dos Marinho.

O Memorial dos Pretos Novos, por exemplo, recebe R$ 90 mil por ano. Enquanto isso, o Portal da Transparência da prefeitura do Rio informa que a Fundação Roberto Marinho já embolsou mais de R$ 56 milhões dentro do projeto "Porto Maravilha" desde 2010.

Além disso, há 12 museus fechados na cidade por falta de verbas.

Não espanta, portanto, que o museu seja administrado por uma instituição ligada à Rede Globo, cuja especialidade é produzir a amnésia social necessária à manutenção de injustiças sociais seculares.

O Museu do Amanhã só consegue ser um tumbeiro encalhado em águas que há séculos vêm sendo manchadas com o sangue derramado pelo racismo.

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