Doses maiores

30 de setembro de 2014

Pra que simplificar se dá pra complicar

O historiador José Murilo de Carvalho foi o entrevistado do programa Roda Viva, em 22/09. Em meio a um bom debate, uma entrevistadora lembrou um texto dele muito interessante. Trata-se de “Como escrever a tese certa e vencer”, publicado no Globo, em 16/12/1999.

Vale a pena ler. Os 15 anos do artigo não o desatualizaram. Destaque para seguinte trecho:

Há três regras básicas que formulo com a ajuda do editor S.T. Williamson. Primeira: nunca use uma palavra curta se puder substituí-la por outra maior: não é ‘crítica’, mas ‘criticismo’. Segunda: nunca use só uma palavra se puder usar duas ou mais: ‘é provável’ deve ser substituído por ‘a evidência disponível sugere não ser improvável’. Terceira: nunca diga de maneira simples o que pode ser dito de maneira complexa. Você não passará de um mero jornalista se disser: ‘os mendigos devem ter seus direitos respeitados’. Mas se revelará um autêntico cientista social se escrever: ‘o discurso multicultural, como ser desconstrutor da exclusão, postula o resgate da cidadania dos povos da rua’.

O tom é irônico, claro. Carvalho não foi eleito para a Academia Brasileira de Letras à toa. Seu rigor científico não implica concessões à linguagem empolada de muitos charlatães universitários.

O artigo encerra-se com a seguinte recomendação:

... não deixe que seu estilo se confunda com o de jornalistas ou outros leigos. Você deve transmitir a impressão de profundidade, isto é, não pode ser entendido por qualquer leitor.

Muita gente anda levando a sério a brincadeira do historiador. E não apenas na academia. Há muito disso na imprensa. E não somente na grande imprensa. Infelizmente...

Leia o artigo na íntegra clicando aqui 


29 de setembro de 2014

O referendo escocês e a pátria dos socialistas


Em setembro, ocorreu o referendo sobre a independência escocesa. No dia 29 deste mesmo mês, 150 anos atrás, era criada a Associação Internacional dos Trabalhadores. Em 1864, algumas dezenas de socialistas se reuniram em Londres para afirmar que os trabalhadores só podem alcançar a vitória organizando-se mundialmente.

Estávamos distantes dos atuais níveis de globalização, mas como disse Daniel Bensaid, em seu “Marx, manual de instruções”:

Do mesmo modo que a globalização vitoriana, por ocasião das grandes exposições universais de Londres e Paris, favoreceu a internacionalização do movimento operário emergente e a criação em 1864 da Primeira Internacional, também a globalização neoliberal suscita uma globalização planetária das resistências. Assim comprova a gênese do movimento alterglobalista, da insurreição zapatista de 1o de janeiro de 1994 aos fóruns sociais mundiais de Porto Alegre, Mumbai e Nairóbi, passando pelas manifestações de Seattle contra a reunião de cúpula da Organização Mundial do Comércio em 1999 e as da primavera de 2003 contra a guerra do Iraque. Comparado ao internacionalismo do século XIX, esse novo internacionalismo enfrenta não apenas os capitalismos nacionais como as empresas multi ou transnacionais e um capitalismo financeiro extremamente globalizado.

No entanto, a luta escocesa pela independência nacional tem que ter o apoio dos socialistas. Por trás dela está o repúdio à austeridade neoliberal que os governantes britânicos defendem. A mesma que causa enormes tragédias sociais na Europa e em outros lugares do mundo.

Quando as lutas nacionais se opõem à globalização capitalista, os internacionalistas têm o dever de apoiá-las. Mas jamais devem esquecer que a pátria dos socialistas é a classe trabalhadora.

Leia também: Por um internacionalismo socialista

25 de setembro de 2014

Você é contra a legalização dos cachorros?


Está disponível na internete o vídeo de uma palestra feita pelo professor Sidarta Ribeiro na Conferência Neurociências e Psicanálise, em 2011. 

Nela o neurobiólogo e diretor do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte defende a legalização da maconha.


Ribeiro começa por afirmar que a maconha está para as plantas como o cachorro para os animais. Ambas são espécies moldadas por nossos ancestrais ao longo de milhares de anos, com muitas variações e diferentes utilidades.

Sidarta destaca os efeitos medicinais dos canabinoides. Eles são inegáveis e admitidos por muitos proibicionistas. Mas não adianta aceitar a utilização terapêutica das substâncias da maconha e não o uso da planta. Seria como confiar na cesariana e duvidar do parto natural, diz ele.


Mortes causadas por consumo de maconha praticamente inexistem. Já a ingestão de álcool e o uso de tabaco e de remédios à venda nas farmácias se mostram muito mais letais. Pessoas morrem não por causa da maconha em si, mas por seu comércio ilegal.


Claro que a erva pode causar problemas graves de saúde para quem é vulnerável a algumas de suas substâncias. Mas o mesmo acontece em relação à lactose, por exemplo. Nem por isso, o consumo de leite foi proibido, compara Ribeiro.


Ao contrário de manter na clandestinidade um consumo que não vai parar, é preciso legalizá-lo. Tal como já acontece com o álcool e o tabaco, substâncias perigosas, mas regulamentadas por órgãos da Saúde Pública. As outras drogas também devem sair da ilegalidade para que possam ter seu comércio fiscalizado.


“Ou você é contra a legalização de cachorros?”, pergunta Sidarta.


Assista ao vídeo, clicando aqui



24 de setembro de 2014

Branco sai. Preto fica! E vice-versa...

Adirley Queirós acaba de receber o prêmio de melhor longa-metragem no Festival de Brasília. O título de seu filme é "Branco sai. Preto fica!". Inspira-se na ordem dada pela polícia ao invadir um baile Black em Ceilândia, cidade satélite de Brasília, em 1986.

Permaneceram somente os negros no recinto. O objetivo era encontrar um suposto criminoso. Na confusão que se seguiu, a polícia distribuiu tiros e pancadas. Vários frequentadores ficaram feridos. Um deles acabou em uma cadeira de rodas. Outro perdeu uma perna. Ambos atuam no filme premiado.

Em 22/9, o diretor deu uma entrevista ao portal R7. Descreveu sua produção como um “filme de vingança. Um ato de terrorismo”. Queirós diz que sua obra pretende “explodir tudo, inclusive a gente. Se não há diálogo, o terrorismo surge”.


Trata-se de uma obra de ficção científica, mas está firmemente ancorada em um passado racista que sempre se fez presente. Não desde 1986, mas há muitos séculos.

Brasília não é a cidade mais injusta do País. Mas certamente é um dos lugares em que nosso apartheid social é mais escancarado. Algo que a arquitetura hostil às multidões só reforça. Por isso, Queirós propõe construir na Capital Federal:

... um setor de domésticas norte e um setor de vigias sul. Está tudo muito vazio. Deveria se construir umas casas para o povo não precisar ir até a rodoviária e pegar depois duas horas de trânsito para chegar nas cidades satélites.

No Plano Piloto de Brasília, assim como em outros centros urbanos privilegiados, depois da hora do trabalho, os pretos é que saem.

Leia também: Pelé nos representa

23 de setembro de 2014

O sotaque inglês do monstro islâmico

     Latuff
Em 23/09, os Estados Unidos iniciaram ataques aéreos contra as tropas jihadistas do Estado Islâmico, na Síria.

A organização é responsável por atos terríveis. Entre eles, decapitações, pessoas enterradas vivas, mutilações de genitálias femininas e crucificações.

A ofensiva estadunidense seria uma tentativa de impedir que as ações terroristas desestabilizem ainda mais a região.

O problema é que o maior fator de violência e caos no Oriente Médio são as décadas de desastrosa intervenção americana.

O Estado Islâmico formou-se em reação à invasão iraquiana pelos Estados Unidos. Mas ao deslocar seus soldados para combater o ditador sírio, Bashar Al Assad, as coisas mudaram. Passou a contar com a simpatia americana e o dinheiro da Arábia Saudita, aliada dos ianques.

O que tornou famosos os jihadistas no mundo todo foi a degola de um jornalista americano divulgada em vídeo, em 19/08. Mas além da covardia da execução, também chamou a atenção o sotaque inglês do carrasco.

O fato não surpreende. O Estado Islâmico conta com milhares de combatentes vindos de várias partes do mundo. São mercenários bem pagos, que lutam movidos por seu fanatismo.

Há quem acredite que o próprio governo americano esteja por trás dos ataques jihadistas. Suas ações serviriam de pretexto para os estadunidenses intervirem militarmente na região.

Mas o mais provável é que seja outro caso de criatura que se volta contra o criador. Semelhante ao que aconteceu com Saddam Hussein e Bin Laden, por exemplo.

A aberração jihadista é uma espécie de filho bastardo do imperialismo ianque. O sotaque do monstro não deixa dúvidas quanto a sua paternidade.

Leia também: A Primeira Guerra na raiz das guerras do Oriente Médio

22 de setembro de 2014

Lembranças indígenas iluminam nossa escura amnésia

Em 22/09, a Folha de S. Paulo publicou o artigo “O primeiro povo indígena anistiado”. Seu autor é Ywynuhu Suruí, do povo Aikewara, da Terra Indígena Sororó, Pará.

O texto anuncia que aquele povo tornou-se o primeiro grupo indígena a ser anistiado de acusações da época da ditadura militar. As falsas alegações os impedem de ocupar plenamente suas terras há 40 anos.

Trata-se de um passo importante rumo à reconquista de seus territórios. Mas, diz o professor, nunca sairão da memória de seu povo as cenas de terror presenciadas na repressão à guerrilha do Araguaia".

Durante três anos, de 1971 a 1973, os Aikewara viveram assustados quando ouviam qualquer barulho de carro ou avião. Logo pensavam que seriam mortos. Muitos tinham insônia, não conseguiam dormir tranquilos porque o tempo todo eram ameaçados por soldados do Exército brasileiro.

Estas terríveis lembranças, porém, foram zelosamente transmitidas por várias gerações. Ainda que doloridas, diz Ywynuhu, tais narrativas precisam continuar sendo “repassadas juntamente com os ensinamentos, as histórias do povo Aikewara, para nossos filhos e netos”.

Talvez, sobre a esses indígenas perseguidos e maltratados o que nos falta. Nossa memória sobre esse terrível período de nossa história foi sequestrada pelos veículos da grande mídia. Os mesmos que apoiaram a ditadura e continuam a produzir narrativas que deixam seus crimes nas sombras.

Cassar as concessões públicas e processar judicialmente as empresas cúmplices do terror de Estado. Julgar e punir carrascos e mandantes. É o mínimo a fazer para honrar a memória dos que tombaram na resistência à ditadura. Desentranhar as lembranças mais tenebrosas para tornarmos o futuro menos escuro.

21 de setembro de 2014

Paulo Freire, educador a serviço da libertação popular

Em 19/09, completaram-se 93 anos do nascimento de Paulo Freire. Não à toa, o grande pedagogo é mais lembrado por seu nome do que por sua obra.

O educador pernambucano defendia a pedagogia como formação de consciência política. Principalmente, entre os mais pobres. Não por acaso, dedicou-se à alfabetização de adultos, cuja ignorância da cultura letrada é aproveitada pelas elites para aumentar sua exploração e opressão.

Mas Freire deveria ser mais estudado pela forças de esquerda que se reivindicam revolucionárias. Para ele, a educação a serviço da revolução não é compatível com a relação que opõe pessoas desprovidas de saberes próprios a quem domina o conhecimento de forma absoluta. Como disse Freire: “... ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção”.

Não basta às práticas educativas que se pretendam revolucionárias apenas afirmarem a defesa da revolução. É preciso tornar consequente, do ponto de vista pedagógico, a terceira tese marxiana sobre Feuerbach. Ela afirma a necessidade de “o educador também ser ele próprio educado”. Do contrário, acabamos por “separar a sociedade em duas partes, uma das quais fica elevada acima da sociedade”. Ou seja, relações autoritárias se estabelecem mesmo entre os que dizem combatê-las.

No mesmo sentido, é importante lembrar a afirmação gramsciana segundo a qual todos os seres humanos são intelectuais. E devem ser respeitados como tal.

Por defender tais princípios, Paulo Freire foi encarcerado pela ditadura militar. Apesar disso, recebeu de universidades como Harvard, Cambridge e Oxford 41 títulos de Doutor Honoris Causa. Certamente, nenhum deles tão honroso como o de educador dos humilhados e ofendidos.


19 de setembro de 2014

Conspirações não existem. Só conspiradores

Em 31/07, Nafeez Ahmed publicou o artigo “Pentágono pesquisa o controle social” no The Guardian. Ele afirma que “militares norte-americanos estimulam e financiam investigações sobre lógica da mobilização social, e como detê-la”. Ainda segundo Ahmed, o programa pretende:

... desenvolver “estratégias relevantes de batalha” a curto e médio prazo para oficiais superiores e responsáveis pelas decisões de uma “comunidade política de defesa”, bem como para informar as políticas implementadas por “comandos de combatente”.

Outro projeto, diz o artigo, é da Universidade de Washington e “pretende descobrir as condições em que se originam os movimentos sociais que visam a mudança política e econômica em grande escala”.

Mas tem mais. Em 2013, o Pentágono criou a Iniciativa Minerva para determinar “quem não se torna um terrorista, e por quê?”. Porém, diz Ahmed, o projeto confunde ativistas pacíficos com “partidários da violência política”.

Enquanto isso, o Facebook organizou uma conferência de Sociologia em maio passado, nos Estados Unidos. O evento pretenderia recrutar cientistas sociais para analisar o enorme banco de dados de que a empresa dispõe. Nossos dados!

Em junho, surgiram denúncias de que o Facebook usou quase 700 mil usuários como objetos de uma pesquisa psicológica sem que eles soubessem. Agora sabemos. Somos nós    os ratos!

Por fim, no final de julho, ficamos sabendo que um laboratório da Google está recolhendo amostras genéticas de vários indivíduos. O objetivo seria constituir um banco de dados que permita “montar”’ um ser “humano perfeito”. Um conceito que deve excluir a grande maioria de nós!

As teorias da conspiração costumam ser delirantes. Mas estão cada vez mais próximas de se tornar realidade.

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18 de setembro de 2014

As ideias dominantes dominam a academia

“Como os ricos dominam” é o título de artigo publicado pelo Valor, em 11/09, escrito por Dani Rodrik, professor de Ciências Sociais em Nova Jersey, Estados Unidos. A principal questão do texto é saber como políticos se elegem e são reeleitos, mesmo quando atendem principalmente os interesses da minoria mais rica.

Tentando responder a pergunta, a matéria cita estudo de dois cientistas políticos estadunidenses. Martin Gilens e Benjamin Page utilizaram dados de pesquisas de opinião realizadas entre 1981 e 2002 nos Estados Unidos. Eles teriam descoberto que quando os interesses das elites são distintos daqueles do restante da sociedade, é a opinião das primeiras que conta para os governantes.

O que explicaria, então, as permanência de governos que agem dessa forma há décadas? O fato de que os “cidadãos comuns” frequentemente têm preferências similares aos dos mais ricos, concluem os pesquisadores. Seria a adoção pelos debaixo dos valores e ideias que favorecem os que ficam acima deles na escala social.

A conclusão semelhante já haviam chegado Marx e Engels em 1846. É o que mostra o famoso trecho de sua obra “A Ideologia Alemã”, que diz: “as ideias dominantes em uma sociedade são as ideias da classe dominante”.

Mas os revolucionários alemães não chegaram a essa conclusão através de estudos acadêmicos. Seu campo de pesquisa era o mesmo em que eram parte atuante. O da militância política. Marx e Engels não estavam à frente de seu tempo. Apenas ligaram-se aos interesses da maioria explorada que lutava por outro futuro.

150 anos depois, a academia ainda reluta em reconhecer o óbvio porque é dominada pelas ideias dominantes.

17 de setembro de 2014

Contra o peemedebismo votos que valem a pena

A sequência de governos petistas no Executivo federal provocou um bom debate entre algumas poucas e brilhantes figuras da universidade. São jovens estudiosos que procuram decifrar o que representa essa experiência na história nacional.

É o caso de Marcos Nobre, que usa o conceito de “peemedebismo”. Para o filósofo, o peemedebismo caracteriza governantes que privilegiam supermaiorias parlamentares. Com isso, ignoram as reformas necessárias e “blindam” o sistema político em relação às pressões da sociedade. Principalmente, de seus setores populares.

Esse modo de governo teria começado já no governo Itamar. Poderia ter sido desafiado pelo governo Lula, mas acuados pelas denúncias do “mensalão”, em 2005, os petistas teriam optado por aderir ao peemedebismo.

Em depoimento à revista Carta Capital, em setembro de 2013, Nobre disse que as jornadas de junho daquele ano eram uma resposta a esse sistema político. Uma revolta contra a democracia reduzida à votação em urna a cada dois anos. Naquela altura, ele esperava que as reações populares provocassem algum tipo de mudança radical, mas não sabia quando, nem como.

No entanto, matéria publicada pelo jornal El País em 11/09 mostra que o peemedebismo continua forte. Na reportagem, Marina Rossi e Afonso Benites dizem que, confirmadas nas urnas as pesquisas, o PMDB “governará, direta ou indiretamente, quase 77 milhões de brasileiros”.

Adequado ou não o conceito utilizado por Nobre, o fato é que a política institucional renova os sinais de que continuará velha. Resta saber se este modo de gerenciar o poder não despertará novas insurreições. Que elas ressurjam em breve e mais radicais são os únicos votos que realmente andam valendo a pena.

16 de setembro de 2014

Setembros e outubros

Em 15/09, completaram-se seis anos da quebra do banco Lehman Brothers. Sete anos antes, também em setembro, acontecia o atentado ao World Trade Center.

No primeiro caso, era início da crise econômica que continua castigando as economias do mundo todo. O segundo deu causa a uma crise militar que gera consequências terríveis até hoje.

Mas ambos os eventos de setembro têm raízes no século passado. Os responsáveis pela queda das torres gêmeas foram financiados pelos americanos nos anos 1980. A Al Qaeda surgiu graças ao apoio estadunidense a Bin Laden e suas tropas contra o domínio soviético no Afeganistão.

As causas mais profundas da crise econômica atual estão no início dos anos 1970. Com o fim do equivalência dólar/ouro decidido pelos Estados Unidos, o capital perdia de vez qualquer ligação com a economia real. A especulação financeira passava a imperar como nunca.

A pairar por sobre os dois eventos de setembro, o fantasma da guerra generalizada. Foram os gastos militares que salvaram o capitalismo na última grande crise antes da atual. A grande recessão de 1929 só foi superada pela 2ª Guerra Mundial.

Forças produtivas e meios de produção ociosos foram literalmente queimados nas frentes de batalha e nos campos de concentração. Costuma-se considerar como marco inicial do mais sangrento conflito bélico da história a invasão da Polônia pelos nazistas. Foi em 1º de setembro.

Para cada um dos setembros catastróficos que ainda possam surgir, é urgente que façamos nascer novos outubros libertários. Tal como aquele que, em 1917, na Rússia, exigiu: “Paz, Pão e Terra”!

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14 de setembro de 2014

A família brasileira segundo o olhar do inimigo

O último episódio de “A grande família” foi ao ar em 11/09, depois de 14 anos de exibição. O seriado da Globo sempre teve audiência acima da média, merecidamente. Elenco e tramas sempre foram muito competentes no ofício de divertir.

A primeira versão da série foi exibida entre 1972 e 1975. Em plena ditadura, o dramaturgo Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, criou a trama para a emissora. Vianinha era comunista e aproveitou o seriado para cutucar o regime dos generais.

A Globo já sabia disputar o jogo hegemônico. Apoiava a ditadura abertamente, mas se permitia ousadias como essa. Foi assim que aprendeu a manter alguma conexão com a vida cotidiana do povão. No caso do seriado de Vianinha, as dificuldades econômicas e trapalhadas de uma família pobre do subúrbio.

No seriado recém-encerrado, o tom é mais conformista e conservador. Despareceu um personagem de esquerda da versão original. E Tuco deixou de ser um hippie questionador para tornar-se apenas um vagabundo. Quase todos os personagens são microempresários. Assalariados, só alguns funcionários públicos.

No lugar da ditadura política, o pensamento único neoliberal. Sai a família proletária, entra a empreendedora.

Mas este último episódio apresentou um toque final malicioso. A simpática família fica sabendo que será representada em um seriado da Rede Globo. Atores famosos são chamados para interpretá-la. Entre eles, Tony Ramos e Gloria Pires. Daniel Filho aparece, em pessoa, para dirigir a produção.

Ou seja, a família média brasileira somente pode conhecer a si mesma por meio da telinha da Globo ou de suas poucas concorrentes. Hegemonia é isso aí. A gente se vê pelo olhar do inimigo. Plim-plim!

Leia um texto de 2007 sobre o seriado no blog Mídia Vigiada.

12 de setembro de 2014

Pelé nos representa

Pelé comentou recentemente o caso do jogador Aranha. Condenou o goleiro santista por ter denunciado o racismo que sofreu por parte de vários torcedores. “Temos que coibir o racismo. Mas não é num lugar público que você vai coibir”, disse ele.

Entre 2002 e 2012, o número de homicídios de jovens brancos caiu 32,3% e o dos jovens negros aumentou 32,4%. E Pelé pede para que nos calemos.

Em março passado, um adolescente negro foi flagrado roubando. Acabou preso pelo pescoço a um poste com uma trava de bicicleta. E Pelé prefere o silêncio.

Há alguns meses, vimos a reação truculenta de lojistas, policiais e autoridades aos “rolezinhos” nos shoppings, organizados por jovens negros. E Pelé recomenda a omissão.

Nas redes virtuais, multiplicam-se os casos flagrantes de racismo. Desde piadas idiotas a imagens mostrando negros sendo humilhados em shoppings e nas ruas. E Pelé não quer escândalos.

Praticamente todos os que são mortos e torturados em delegacias, prisões e outras dependências do Estado têm a pele escura. E Pelé pede sigilo e privacidade.

Do total de candidatos inscritos para as próximas eleições, 55% são brancos. Os que se assumiram negros são pouco mais de 9%. Amarelos e indígenas mal ultrapassam 1%.

Marina Silva teve a dignidade de se declarar negra em seu registro como candidata. Mas não disse palavra sobre o racismo em sua campanha. O mesmo vale para os outros dois líderes nas pesquisas eleitorais.

Pelé já tem o silêncio que almeja. O grande atleta negro ainda é sinônimo de Brasil pelo mundo. Também é a maior prova da vitória de nosso racismo.

11 de setembro de 2014

Delação empresarial e eleição premiada

Em 08/09, Beatriz Borges publicou a reportagem “Mais de 80 empresas colaboraram com a ditadura militar no Brasil” no jornal El País. Trata de relatório da Comissão Nacional da Verdade, mostrando o envolvimento empresarial em espionagem e delação de quase 300 de seus trabalhadores durante o regime militar.

Entre os 297 nomes relacionados no levantamento estão Paulo Okamotto, Jair Meneguelli, Vicentinho e Lula. Eram as principais lideranças dos movimentos grevistas do final dos anos 1970. Todos dirigentes sindicais democraticamente eleitos colocados sob a mira dos gorilas da ditadura por seus patrões.

Não à toa, muita gente defende que se deve caracterizar o regime implantado em 64 como uma ditadura empresarial-militar.

Em 10/09, o portal IHU-On Line publicou entrevista com Gil Castello Branco, secretário-geral da ONG Contas Abertas. Ele afirma categoricamente: “As empresas não votam, mas são elas que elegem”. E explica:

... os empresários, cada vez mais, não doam, mas investem, ou seja, repassam recursos com a expectativa de ganhos futuros. Não é apenas por espírito democrático que eles fazem doações, inclusive, a candidatos adversários. Eles doam apenas com o intuito de manter uma boa relação com qualquer um dos candidatos que seja eleito.

Diante disso, poderíamos dizer que vivemos sob uma ditadura econômico-eleitoral.

Felizmente, há muitas diferenças entre um regime e outro. O que assusta são as cambalhotas da História. Muitos dos que fizeram parte da lista suja dos empresários, hoje ocupam o topo da política nacional. Seus nomes passaram a figurar entre os beneficiários das doações eleitorais feitas pelo grande capital. Passaram de uma lista à outra. De um lado da sujeira ao outro.

10 de setembro de 2014

Plebiscito pela Constituinte: sim, não, talvez...

De 1 a 7 de setembro, aconteceu o plebiscito popular por uma constituinte. O objetivo é fazer uma reforma política por uma assembleia constituinte que se dissolveria uma vez encerrados os seus trabalhos.

É inegável a crise de representatividade da política institucional brasileira, sinalizada pelas manifestações de junho de 2013. Mas os números indicam pouco entusiasmo popular pela iniciativa. Menos de 2 milhões participaram. Em 2000, mais de 6 milhões votaram no plebiscito da dívida externa. Em 2002, a consulta em relação à ALCA ultrapassou os 10 milhões.

Amplos setores de esquerda e dos movimentos sociais ajudaram a organizar o plebiscito. Mas a proposta parece servir sob medida ao governo federal. A ideia seria dar uma resposta aos protestos de junho de 2013, desviando a atenção das desastradas opções governamentais petistas para o Legislativo. Não à toa, foi realizado em plena campanha eleitoral.

Mas, além disso, nada impede a eleição de uma maioria conservadora para a constituinte. Uma grande representação bancada pelo poder econômico que já domina as atuais eleições. A limitação temática também não evita que sejam aprovadas medidas que reduzam o alcance de direitos políticos. Por exemplo, restrições à organização de partidos de esquerda.

Por fim, mesmo que fossem aprovadas propostas que realmente democratizem a política, podem virar letra morta como já acontece com muitos outros direitos constitucionais.

É legítima a ideia de democratizar os canais institucionais para barrar o avanço da direita. Mas também é grande o risco de eleger uma constituinte dominada por conservadores. A encomenda que parece ser petista pode acabar chegando ao endereço de nossos inimigos.

Leia também: Dilma e Marina traem suas próprias trajetórias

9 de setembro de 2014

Dilma e Marina traem suas próprias trajetórias

Estranho o escândalo que muitos petistas andam fazendo em torno dos recuos de Marina Silva.

É verdade que a candidata pessebista voltou atrás no apoio ao casamento gay e no combate ao agronegócio e aos transgênicos. Também mudou de ideia quanto à necessidade de revisar a anistia que livra a cara dos torturadores da ditadura militar. Mas Dilma fez coisas muito parecidas.

Em 2010, no segundo turno, a campanha de Serra insinuou que a petista seria favorável ao aborto e ao casamento gay. A candidata petista lançou uma Carta Aberta que tinha entre seus compromissos a manutenção da legislação que criminaliza o aborto. Também prometeu não tomar qualquer iniciativa que afrontasse “a família”. Ou seja, virou as costas para as lutas das mulheres e LGBT.

Depois de eleita, a presidenta mostrou que tem palavra. Pelo menos, quando ela é empenhada junto a setores conservadores. Em maio de 2011, Dilma vetou a produção de um kit anti-homofobia que seria distribuído nas escolas pelos Ministérios da Educação e da Saúde.

A descriminalização do aborto continua engavetada. Mesmo que isso continue custando a vida de milhares de mulheres.

Em 31 de março passado, quando se completavam 50 anos do golpe militar, a presidenta declarou ser contrária à revisão da Lei da Anistia. Optou por manter intacto esse dispositivo legal, que mantém longe dos tribunais os carrascos do Regime Militar.  

Nada disso torna a candidata petista muito pior que sua adversária. Ambas se igualam na firme determinação de traírem a dignidade de suas próprias trajetórias, enquanto renegam o presente e o futuro a milhões de lutadoras e lutadores.

8 de setembro de 2014

Os produtores de notícias

É um erro pensar que um jornal é editado para fazer jornalismo. Na verdade, ele é editado para publicar publicidade. O jornalismo é o recheio do entorno dos anúncios. O papel dos jornalistas é subalterno e sua função primordial é proporcionar a melhor tiragem para obter a venda mais fácil e o melhor preço do espaço publicitário no jornal.

Estas palavras foram ditas por Janio de Freitas no mais recente documentário de Jorge Furtado. A excelente produção traz entrevistas com vários jornalistas importantes. Ao lado do próprio Janio, estão Mino Carta, Raimundo Pereira, Geneton Moraes, Bob Fernandes e muitos outros. Além disso, o filme intercala os depoimentos com trechos da peça teatral do dramaturgo inglês Ben Jonson, “O Mercado de Notícias”, que dá nome ao filme.

Na peça de Jonson, o personagem principal é Dona Pecúnia. É para conquistá-la que os mercadores de notícia se desdobram em seu ofício. Mas quem poderia mostrar quais são os meios para seduzi-la é outra personagem, que não aparece na obra teatral, nem no filme de Furtado. Trata-se de Dona Hegemonia. É ela que sabe quais os ingredientes capazes de obter o produto que torna possível conquistar a “melhor tiragem”. Trata-se da credibilidade.

A credibilidade trabalha com as crenças, costumes, hábitos, preconceitos, medos e outros elementos do senso comum. Tais ingredientes devem ser organizados de modo a justificar a ordem social em que vivemos. Mesmo sendo injusta, violenta e opressora, ela deve ser aceita e elogiada. Esta é a mercadoria da linha de produção em que trabalham os jornalistas a serviço de Dona Pecúnia e sob orientação de Dona Hegemonia.

Leia mais sobre o filme em Dona Pecúnia e Madame Hegemonia mandam notícias

4 de setembro de 2014

O caso Grêmio: nosso racismo exige discrição

    Latuff
De forma inédita, o Grêmio foi eliminado da Copa do Brasil pelos atos racistas de alguns de seus torcedores. Mas nem deu tempo de comemorar a decisão do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Logo surgiram evidências de que o mesmo crime foi cometido por um dos membros do próprio tribunal.

Trata-se de Ricardo Graiche, que teria postado fotos racistas nas redes virtuais, em 2012. Uma delas mostra um bebê negro enrolado em um rótulo de Pepsi. Uma estupidez das mais repugnantes.

Mas o episódio pode ajudar a explicar a decisão do STJD. Apesar de justa, ela pode ser interpretada como uma forma de isolar o caso. A pressa e o rigor do tribunal, talvez, tenham menos a ver com o combate ao racismo que seu ocultamento. Prontamente condenadas, as atitudes seriam apenas manchas em nossa “democracia racial”.

Essa ideologia racial branca afirma que os negros sofrem constrangimentos por sua condição social e não devido à cor de sua pele. Assim, um negro rico sofreria menos discriminação que um pobre. A ascensão social seria suficiente para lhe garantir tratamento respeitoso.

Ou seja, o discurso dominante prefere admitir a existência de injustiças sociais que as de caráter racial. Afinal, temos uma das maiores populações negras do planeta. Seria perigoso uni-la em torno de algo que a ofende em seu conjunto. Melhor que seja convencida de que as condições sociais muito piores em que vive são resultado de situações individuais.

Essa lógica explicaria por que um juiz condena o racismo berrado nos estádios, enquanto discretamente alimenta o seu. Silencioso e letal como um bicho peçonhento.

A mídia golpista agradece o apoio petista

   Latuff
Em 23/08, Najla Passos publicou o artigo “Por que os brasileiros desconhecem as realizações do governo Dilma?”. O texto afirma que, em 2014, o Jornal Nacional exibiu mais de 9 horas de notícias desfavoráveis ao governo petista, contra apenas 45 minutos de favoráveis. Trata-se de mais um excelente artigo da jornalista sobre as distorções da grande mídia contra o governo petista.

Como Najla, vários outros nomes das mídias alternativas de esquerda fornecem muitos dados que mostram o trabalho de sabotagem da grande imprensa contra o PT e seu governo. É o caso de Laurindo Lalo Leal Filho, Venício de Lima e Luciano Martins Costa. No entanto, parece haver uma espécie de desencontro entre o que os petistas no poder fazem e essa visão crítica mais que justa.

Em 29/08, Theófilo Rodrigues publicou no Correio do Brasil a reportagem “Governo federal patrocina concentração da mídia no país”. O texto trata da distribuição das verbas oficiais de publicidade do governo federal. E afirma que, apenas em 2012, foram repassados R$ 1,797 bilhão para as empresas de comunicação. Deste valor, 63% foram destinados somente para as empresas de televisão.

Enquanto isso, a internete, que abriga alguns dos melhores defensores do governo petista, ficou com insignificantes 5,32% das verbas oficiais. Mas o pior é que a reportagem descobriu que grande parte dos recursos voltados para a publicidade na rede mundial tem sido repassada para o Google!

Ou seja, quer saber por que os brasileiros desconhecem as realizações do governo Dilma? Pergunte, em primeiro lugar, ao governo Dilma.

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3 de setembro de 2014

Marx e os trovões do capital

Altamente recomendável a leitura de “Marx, manual de instruções”, de Daniel Bensaid, publicado pela Boitempo. Uma das chaves do livro é a atualidade da obra do revolucionário alemão. Principalmente, em relação a duas obras fundamentais: o “Manifesto do Partido Comunista” e “O Capital”, ambos com a fundamental parceria de Engels.

A respeito do Manifesto, Bensaid destaca alguns conceitos que são mais válidos que nunca. É o caso do proletariado, que muita gente confunde com operariado. Uma nota de Engels mostra que isso é falso e redutor:

...por proletariado [entende-se] a classe dos assalariados modernos que, não tendo meios próprios de produção, são obrigados a vender sua força de trabalho para sobreviver.

Por essa definição, os proletários nunca foram tantos. Eles não apenas estão em enormes fábricas na China. Estão no comércio, bancos, telecomunicações, instituições públicas em todos os lugares. Grandes contingentes obrigados a vender sua força de trabalho.

Quanto a “O Capital”, Bensaid cita o filósofo Gérard Granel, que descreveu a obra como “um trovão inaudível”. Mas, como diz o autor, “inaudível talvez para aqueles que foram seus contemporâneos. O estrondo desse trovão, no entanto, não deixou de se amplificar desde então, a ponto de ser hoje ensurdecedor”.

Bensaid refere-se à crise de 2008, que continua atingindo as economias no mundo todo. Mas também ao efeito destruidor da acumulação capitalista. São desastres climáticos e ecológicos, epidemias, violência urbana, desigualdade social etc. A isso tudo somam-se as guerras, cada vez mais constantes e intensas.

O grande desafio continua sendo fazer com que o som da marcha do proletariado se sobreponha às assustadoras trovoadas do capital.

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2 de setembro de 2014

Falta pouco para nos unirmos aos povos europeus

Existe a corrupção pré-eleitoral: o financiamento de pessoas e partidos por fontes ilegais – em troca da promessa, explícita ou tácita, de favores futuros. Existe a corrupção pós-eleitoral: o uso do cargo para obter dinheiro pela malversação de receitas, ou por propinas em contratos. Existe a compra de vozes ou votos nos parlamentos. Existe o roubo direto do erário. Existe o enriquecimento resultante do exercício de cargo público, antes, durante ou depois.

O trecho acima não diz respeito à política institucional brasileira. É de um longo e esclarecedor artigo de Perry Anderson publicado na revista Piauí, em agosto. O título é “Berlusconização da política” e refere-se ao que vem acontecendo na Europa.

Anderson faz um panorama da lama em que chafurdam governantes de vários cantos da Europa. Não apenas na Itália, nem somente Berlusconi. Este último serve apenas como imagem que resume tudo.

Os alemães Helmut Kohl e Gerhard Schröder. Os franceses Jacques Chirac, François Hollande, Nicolas Sarkozy. O espanhol Mariano Rajoy. O grego Akis Tsochatzopoulos e o turco Tayyip Erdogan. Estes são apenas alguns dos governantes da União Europeia envolvidos em escândalos bilionários. Com exceção de Tsochatzopoulos, condenado à prisão, o restante continua ileso.

Nada mais lógico. Afinal, diz o artigo, se “hospitais, escolas e prisões podem ser privatizados e transformados em empresas lucrativas, por que não seria assim também com os cargos públicos?”

Enquanto isso, a Zona do Euro afunda cada vez mais na recessão. No Brasil, ainda não chegamos a isso. Mas já temos na política oficial uma base moral comum para pensar nos povos europeus como companheiros de infortúnio.

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1 de setembro de 2014

Marina Silva e a poeira de nossos pés

   Latuff
A liberdade sexual volta ao centro dos debates nas eleições presidenciais. Mais especificamente, pela decisão de Marina Silva de retirar de seu programa a defesa do casamento gay.

O recuo deveu-se a pressões de lideranças cristãs que condenam o homoerotismo com base em passagens da Bíblia. Uma das mais lembradas envolve Sodoma e Gomorra, destruídas por Deus porque seus moradores seriam adeptos do amor homossexual. Daí, o termo “sodomia”.

O trecho mais lembrado está em Gênesis (19:5). Descreve o modo como homens que visitavam Ló foram tratados pelos moradores de Sodoma. Eles teriam exigido: “Traze-os a nós para que os conheçamos.”

A expressão “conhecer”, na Bíblia, é muito utilizada como sinônimo de relação sexual. Há quem negue que o termo tenha sido utilizado nesse sentido na passagem em questão. Mas mesmo que assim fosse, ainda é possível enxergar a falta de hospitalidade como o grande pecado dos sodomitas.

Em Ezequiel (16:49), Sodoma é condenada por nunca ter amparado “o pobre e o necessitado”, por exemplo. Já em Mateus (10:13/15), Jesus teria advertido contra o pecado da falta de hospitalidade, dizendo:

... se alguém não vos receber, nem der ouvidos às vossas palavras, assim que sairdes daquela casa ou cidade, sacudi a poeira dos vossos pés. Com toda a certeza vos afirmo que haverá mais tolerância para Sodoma e Gomorra, no dia do Juízo, do que para aquelas pessoas.

Ou seja, há muitas maneiras de interpretar textos tidos como sagrados. As escolhas dizem mais sobre os intérpretes do que sobre o objeto interpretado. No caso de Marina e seus aliados religiosos, melhor sacudi-los de nossos pés.

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