Doses maiores

17 de dezembro de 2014

Cinco séculos, ontem e anteontem

Ontem, indígenas tentaram entrar na Câmara Federal. Protestavam contra a Proposta de Emenda Constitucional 215. A medida pretende deixar nas mãos de um congresso empesteado de ruralistas a decisão sobre a demarcação de suas terras. Foram violentamente reprimidos, obviamente. 

Anteontem, Kátia Abreu assumiu a presidência da Confederação Nacional da Agricultura. O próximo passo é deixar o cargo para tornar-se ministra da Agricultura. Presente, Dilma se mostrou entusiasmada. Disse que a “parceria” com a rainha dos ruralistas está apenas começando. A peste também se aproxima do Executivo, a convite de sua titular recém-reeleita.  

Há quase 20 anos, em 1995, Darcy Ribeiro lançava “O povo brasileiro”. Um dos trechos do livro contém mais atualidade que as notícias acima: 

Nada é mais continuado, tampouco é tão permanente, ao longo desses cinco séculos, do que essa classe dirigente exógena e infiel a seu povo. No afã de gastar gentes e matas, bichos e coisas para lucrar, acabam com as florestas mais portentosas da terra. 

Desmontam morrarias incomensuráveis, na busca de minerais. Erodem e arrasam terras sem conta. Gastam gente, aos milhões. Tudo, nos séculos, transformouse incessantemente. Só ela, a classe dirigente, permaneceu igual a si mesma, exercendo sua interminável hegemonia. Senhorios velhos se sucedem em senhorios novos, super-homogêneos e solidários entre si, numa férrea união super-armada e a tudo predisposta para manter o povo gemendo e produzindo. Não o que querem e precisam, mas o que lhes mandam produzir, na forma que impõem, indiferentes a seu destino. 

Como mostram aqueles dois episódios recentes, os senhorios continuam “solidários entre si”, em “férrea união super-armada”. Os velhos e os novos. 

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