Doses maiores

22 de outubro de 2013

O brasileiro cordial e sua caixa de ódio

O historiador Sérgio Buarque de Holanda, em seu livro “Raízes do Brasil”, criou o conceito de “homem cordial”. No capítulo do livro que leva esse título, ele diz:

Já se disse, numa expressão feliz, que a contribuição brasileira para a civilização será de cordialidade – daremos ao mundo o “homem cordial”. A lhaneza no trato, a hospitalidade, a generosidade, virtudes tão gabadas por estrangeiros que nos visitam, representam, com efeito, um traço definido do caráter brasileiro...

Diante da polêmica que cercou essa definição, o autor esclareceu em nota na 2ª edição:

...essa cordialidade estranha, por um lado, a todo formalismo e convencionalismo social, não abrange, por outro, apenas e obrigatoriamente, sentimentos positivos e de concórdia. A inimizade bem pode ser tão cordial como a amizade, nisto que uma e outra nascem do coração, procedem, assim, da esfera do íntimo, do familiar, do privado.

A palavra cordial tem raiz em coração e afeto. Afeto não remete apenas a carinho ou ternura. Também pode ser usado para emoções como ódio e raiva. E o coração pode se transformar na “caixa de ódio” da canção de Lupicínio Rodrigues.

Talvez, seja uma boa metáfora para o que vem acontecendo no Brasil há séculos. Muito carinho, afeto ou apenas bons modos entre os que ocupam o andar de cima. Muita porrada e humilhação dispensadas aos ocupantes do rés do chão e abaixo dele.

Todos os “grandes episódios” de nossa história são marcados por essa cordialidade tão brasileira. Fenômeno que ganhou nova visibilidade desde que começaram as manifestações em junho passado. E a caixa de ódio pulsa cada vez mais forte.

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